domingo, 9 de maio de 2010

Dica de livro...


Ensaio sobre a cegueira


O livro conta a história de pessoas “normais” vivendo seu cotidiano, mas de repente um homem é acometido de uma cegueira branca, fora do comum, logo várias pessoas são contagiadas e as autoridades colocam eles em quarentena num manicômio desutilizado. Desses, ganham destaque o primeiro cego, a mulher do mesmo, uma rapariga, um velho, um menino estrábico, um médico de olhos e sua mulher que durante todo o livro é a única que consegue enxergar tornando-se assim os olhos dos leitores.
A partir do momento em que são trancafiados, eles passam por um processo de desumanização. Com a chegada novas pessoas todos os dias a luta pela sobrevivência passa a ser constante. Graças a um incêndio provocado por uma cega para se vingar de um grupo controlador que abusou de todas as mulheres da quarentena, os cegos do manicômio consegue sair dali guiados pela mulher do medico.
Ao sair, se deparam com algo surpreendente: todos estão cegos. A cidade está um caos e a única que consegue enxergar toda a destruição é a mulher do medico que ainda possui forças para abriga-los em sua casa e ainda buscar alimentos para dar ao seu pequeno grupo o que comer.
Quando todos estão na casa do medico, o primeiro cego volta a enxergar, depois sua mulher, o velho, a rapariga, o menino estrábico e por fim o medico.
O livro de Saramago nos mostra o quanto estamos sujeitos a ser acometidos por essa cegueira social que nos faz desumanos. Onde a luta pela sobrevivência e pelo poder nos faz agir como animais irracionais e viver na podridão.

Autor: SARAMAGO, JOSE
Editora: COMPANHIA DAS LETRAS
Assunto: LITERATURA ESTRANGEIRA - ROMANCES

quarta-feira, 5 de maio de 2010

O Ato Médico! retirado do Scielo Brasil


Psicologia em Estudo
Print version ISSN 1413-7372
Psicol. estud. vol.11 no.2 Maringá May/Aug. 2006

doi: 10.1590/S1413-73722006000200001
EDITORIAL



O Ato Médico e suas implicações





Neste segundo número de 2006, a revista Psicologia em Estudo apresenta um dossiê sobre Saúde constituído de 15 artigos, os quais instigam à reflexão sobre a relação Psicologia e Saúde a partir de diversos contextos e abordagens.

Entendemos que falar de saúde é, necessariamente, falar de saúde pública, o que significa, a um só tempo, o atendimento à população quanto à prevenção da doença e promoção da saúde e atividades e atuações multidisciplinares.

De acordo com a Carta de Otawa (1986), o paradigma que se delineia quanto à promoção da saúde é o de uma perspectiva interacional, envolvendo vários campos de conhecimento concebidos como produção social, determinados pelos aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais.

É exatamente este paradigma que vai nortear as diretrizes e princípios do SUS. O Sistema Único de Saúde visa, assim, ao processo de humanização na área da saúde, buscando superar o enfoque biologicista das práticas em saúde e direcionar essas práticas para uma atuação que inclua os "aspectos sociais que condicionam e determinam a vida, o adoecimento e a morte das pessoas."1

Não obstante, o que temos hoje na área da saúde é um continuado retrocesso quanto às intenções acima mencionadas. Este retrocesso se dá em função da iminência de aprovação, no Senado, do Ato Médico. Desta forma, não há como deixar de mencioná-lo, seja no sentido de esclarecer nossos leitores quanto às suas implicações, seja no sentido de fazer deste editorial um manifesto de repúdio à sua aprovação.

O Ato Médico – Projeto de Lei nº 025/2002, de autoria do ex- senador Geraldo Althoff (PFL- SC – médico pediatra) e atualmente sob a relatoria da Senadora Lúcia Vânia (PSDB- GO) - tem como objetivo regulamentar a Resolução 1627/2001 do CFM, estabelecendo que atividades relacionadas à saúde como diagnósticos ou tratamento passam a ser de exclusiva competência do médico. Ficam assim afetadas ou subordinadas ao médico várias profissões da área da saúde.2

As implicações deste projeto são várias, mas podemos destacar algumas.

Quanto ao SUS, contraria a concepção de saúde como "um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício" (Brasil, 1990)

Considerando-se que a ideologia neoliberal pressupõe o Estado Mínimo e que isto significa acabar com o bem-estar social, isto é, privatizar o que é público, o Ato Médico fere mais uma vez a legislação vigente relativa à saúde, a qual dispõe como dever do Estado garantir a saúde "formulando e executando políticas econômicas e sociais que visem a redução de risco de doenças e de outros agravos, e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (Brasil, 1990). O Ato Médico priva o cidadão de ter outros atendimentos que não o do médico. Além disso, pressupõe uma reserva de mercado, ao excluir da área da saúde outras profissões que, numa atuação multidisciplinar, podem contribuir para a cura, prevenção de doenças e promoção da saúde.

A Organização Mundial de Saúde lembra que "A saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não consiste apenas em ausência de doença ou enfermidade"3. A saúde mental é um aspecto fundamental da saúde, que permite ao ser humano aproveitar plenamente suas aptidões cognitivas, afetivas e relacionais. Uma boa disposição mental possibilita enfrentar as dificuldades da vida, trabalhar de forma produtiva e contribuir para as ações da sociedade.

Desta forma, o Ato Médico contraria o conceito de que saúde significa bem-estar geral, e não só ausência de doença. O modelo médico embasa-se numa visão de homem enquanto ser natural que se explica pela suas condições biológicas, e a saúde é entendida como contrária a doenças, sendo aquela a condição de adaptação à sociedade, o que equivale à consagração do binômio normal - anormal. Atualmente, com a complexidade e dinamicidade da sociedade, o conceito de saúde vem se modificando, não se estabelecendo somente na condição biológica do homem, mas também na sua constituição e interação social. Sendo assim, a saúde passa a ser conceituada como a condição de enfrentamento do homem diante das diversidades atuais.

Com o Ato Médico parece haver um engessamento do conceito de saúde que nos lembra as atividades de higienismo do século XIX, como forma de normatizar, padronizar e adaptar os indivíduos ao modelo socioeconômico vigente. O modelo curativo deveria ser superado pelo modelo preventivo.

O deputado Dr. Rosinha (2006), ao afirmar que "o avanço de um sistema de promoção à saúde e construção da cidadania depende muito mais de atuação coletiva (atos pela cidadania) dos profissionais do que do individualismo do ato médico"(online), explicita uma das condições fundamentais do neoliberalismo, que é o individualismo. A afirmação do CFM é que o campo das doenças e da saúde é ato privativo do médico. Isto pode significar um olhar dirigido somente para o sintoma da doença, e não para sua causa.

Vamos ao considerado pai do neoliberalismo, Hayek (1987/1944), em sua obra O caminho da servidão. "(...) o sistema de objetivos do indivíduo deve ser soberano, não estando sujeito aos ditames alheios. É esse reconhecimento do indivíduo como juiz supremo dos próprios objetivos, é a convicção de que suas idéias deveriam governar-lhe tanto quanto possível a conduta, que constitui a essência da visão individualista" (p.76) . Hayek considera ainda importante uma sociedade concorrencial, por ela permitir a competitividade; assim o corporativismo é permitido, traduzido, por exemplo, numa classe de profissionais que protege seus interesses através de normas estabelecidas pelo Estado.

A idéia de que o indivíduo ou determinada classe de profissionais se bastem significa abolir qualquer trabalho coletivo. O caráter individual pressupõe a um só tempo a eficiência e a autogestão, que podem se converter em sucesso ou fracasso, pois dependem do indivíduo ou classe.

Neste sentido, acreditamos que boa parte da classe médica ainda não se deu conta de que a autonomia estabelecida pelo Ato Médico também tem um preço. Eles, os médicos, passam a ser os únicos responsáveis pela doença/cura do cidadão, não podendo partilhar dúvidas com outros profissionais. É a afirmação de que uma única classe de profissionais da saúde é capaz de dar conta de toda a complexidade atual. Como será que ela responderá ao momento em que vivemos?

Cremos que devemos ouvir atentamente a proposta do deputado Dr. Rosinha, segundo a qual, ao invés de discutir a definição do que seja o Ato Médico, deveríamos pensar na construção de um código onde a responsabilidade ética seja de toda a equipe profissional que atua sobre o ser humano, e não apenas de uma categoria.4



REFERÊNCIAS

Brasil (1990) Lei 8080 de 19/09/1990 – que dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde. Disponível em http://www.saude.inf.br/legisl/lei8080.htm (Acesso em 29/09/2006).

Dr. Rosinha (Florisvaldo Fier) (2006) Atos pela cidadania. Disponível em http://www.fonosp.org.br/publicar/arquivos/ imprensa/Atos520pela520cidadania.doc. (Acesso em 29/08/2006)

Hayek, F. A. (1987) O caminho da servidão. (A. M. Capovilla, J. I. Stelle & L. de M. Ribeito). Rio de Janeiro: Expressão e Cultura: Instituto Liberal. (Original publicado em 1944)





1 http://www.naoaoatomedico.com.br/paginterna/profis_psicologia.cfm
2 http://www.naoaoatomedico.com.br/index/index.cfm
3 http://www.saudemental.med.br/OMS.htm
4 http://www.amigasdoparto.org.br/mid_2005_02_11_ato.asp